Bacafá

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sábado, 27 de junho de 2009

Libertango, um pouco de história.

Texto de Renato Flesch, como comentário do post de Astor Piazzolla. Vale a pena ler pela história.

"Libertango foi composto por volta dos anos 1972/1973, quando Astor Piazzolla (sobrenome Pantaleón) já decidira ser um tanguero refinado e morando na Itália.

É bem possível que o título esteja relacionado ao eterno dilema que Piazzolla vivia entre ser um tanguero por obrigação e um caçador frenético de novas alternativas para se libertar daquele tango tradicional, batido e melancólico ao extremo. Para sua evolução, teve de morar no exterior para não sofrer a marca de evolucionista sem causa.

Digo isto apenas como uma suposição, porque na época era inadmissível os tangueros mais tradicionais aceitarem o ingresso de cordas, bateria e até mesmo orquestra junto com o tango, coisa que Piazzolla conseguiu fazer com genialidade porque estava fora do epicentro do tango na Argentina e sentia-se livre para compor.

Talvez sua inspiração para o Libertango tenha vindo da recordação dos céus de Buenos Aires.
Tom Jobim certa vez disse que Nova Iorque deveria ser vista com o sujeito deitado num carro com teto de vidro para contemplar o céu e os arranha-céus. Eu digo que Buenos Aires deveria ser vista ao som de Libertango.

De compasso quaternário batido forte como marca o tango, talvez não exista música mais versátil que esta. Da marimba ao acordeon da bela artista grega Zoe Tiganouria passa pelas pop´s Bond Girls com seus violinos elétricos, pela Orquestra de bandolins holandesa chamada Het Consort e chega ao oriente pela conservadora versão da Orquestra Sinfônica da Coréia e pela versão do coral Accapella, do Hong Kong Childrens' Choir Chamber.

Na europa, há uma versão “light bossa” do European Jazz Trio, talvez pensando que Buenos Aires fosse a capital do Brasil.

A Soprano argentina Josefina Scaglione uiva libertango com uma doçura incrível, mas não tão arrebatadora.

Até Grace Jones canta Libertango sob mesmo título, “Strange” ou “I´ve seen that face before”. Esta versão exótica embalou o drama de Harrison Ford no filme “Busca frenética” em que ele, com aquela cara de quem foi tomar uma Marguerita, mas só lambeu o sal, chupou o limão e não bebeu a tequilla, sai em busca de sua cara metade seqüestrada em Paris. Esta vale a pena conferir.

Da mesma forma, por curiosidade, vale conferir, também, Hermeto Pascoal, que faz uma versão que poderia ser chamada de “loucura sobre um tema de Piazzola”.

Porém, as notas mais elevadas sobre as versões do Libertango se devem a Richard Galliano, um francês que derrete o bandoneon de forma linda e harmônica, com a habilidade do compositor original; ao violoncelista Yo Yo Ma (aquele japonês que, em 1999, depois de um concerto no Carnegie Hall, esqueceu no táxi seu violoncelo Montagnana, que vale US$ 2,5 milhões, mas depois o recuperou...ufa!) que toca com a facilidade e a beleza de uma criança que empina uma pipa, e por fim, Daniel Barenboim, o maior regente da atualidade, da Filarmônica de Berlim, quando regeu a Orquestra Filarmônica de Buenos Aires ao ar livre em dezembro de 2006, cuja versão chega a arrepiar!

Piazzolla certa vez disse que sua maior obra foi o réquiem “Adios Nonino”, composta no leito de morte de seu pai, mas ouso adicionar LIBERTANGO.

Aos aficcionados por Piazzolla, sugiro que assistam a versão de Oblivion, tocada pela Orquestra de Câmara do Kremlim. É bem conservadora, mas de uma beleza e magnitude esplendorosa.

Por fim, para matar a saudade, assistam ou procurem ouvir qualquer coisa que conste Pablo Ziegler, um dos maiores parceiros de Piazzolla e o melhor pianista de tango do “Tango Nuevo”, mas que, apesar de ser refinado, possui alma essencialmente “tanguera”, daquelas de dar gosto.

Todas as versões citadas podem ser conferidas no youtube."

3 comentários:

Paulo César Nascimento disse...

Muito bom o texto do meu primo por afinidade! Renato, você decididamente dá pra blogueiro! Abraços!

Anônimo disse...

O comentário do Paulinho me deixa bastante envaidecido, sobretudo pela sua inteligência e conhecimento de música (Diz ele que dedilha "Mood for a day"). Apenas gostaria de registrar que não sou chegado a dar pra blogueiro nenhum! Renato Flesch.

Anônimo disse...

Gostei muito do texto, não adianta só tocar, precisamos saber o que o autor pensava enquanto criava a obra, o que ele vivia, que dilemas e que alegrias. Muito bom!